terça-feira, 18 de agosto de 2009

Relógio Biológico

É claro que uma pessoa que sempre foi tão avoada+doida+porralouca como eu, grávida, escuto todo tipo de questionamento sobre o tal relógio biológico, que nos desperta para a incrível, fantástica e única experiência de ser mãe... As pessoas cujo "relógio" já bateu as doze badaladas, perguntam sobre os detalhes dessa sensação ímpar, ou às vezes só sorriem para a barriga quando você passa (como diria minha colega blogueira do Blog da Grávida! :D)...
Adianto às pessoas que têm fé no tal relógio que não me perguntem absolutamente nada, caso não desejem se decepcionar amarrrrrrgamente: salvo esta linda peça em aço cirúrgico e mostrador cor-de-rosa que se encontra no meu pulso esquerdo, eu não tenho "relógio".
A verdade é que não tenho muita fé nesse relógio maternal, e nunca me dispus a ouvi-lo...
Estranhamente, vejo mulheres desejarem um filho, sob o signo do "relógio biológico falando", em momentos onde sua vida emocional não está tão equilibrada assim, ou como manifestação de uma necessidade de "ter alguém" que supostamente não vai lhe abandonar...
Sempre me pareceu, seguindo esse viés, que a conversa de "relógio biológico" só serve às mulheres que têm filhos pra completar algo "vazio" em si. Algumas até afirmam esse vazio...
Isso sempre me lembrou algo meio Freudiano, em razão da tal "perda narcísica" da castração, como modo de sentir-se verdadeiramente mulher, completa em sua feminilidade, a qual lhe foi restringida na infância... Desejar criar uma criança não para formar um ser distinto, independente, mas para corresponder, nesse pequeno ser, à figura arquetípica de mãe (e dizer a famosa frase: "eu sou sua mãe!", aquela que responde a quase todos os questionamentos do rebento e que pode ser dita em todos os tons...!!). O filho não é uma pessoa, é quase uma posse desta mulher.
"Ela abandona seu desejo de um pênis e coloca em seu lugar o desejo de um filho, com esse fim em vista, toma o pai como objeto de amor. A mãe se torna objeto de seu ciúme. A menina transformou-se em uma pequena mulher." (Sigmund Freud, 1925).
Ok, ok, nós mulheres temos os nossos instintos... E temos a boa e velha intuição, também. Não estou excluindo toda e qualquer manifestação do DNA em relação a filhos. O que considero meio estranho - e Deus ajude que seja por pura ignorância minha - é a necessidade de um filho! Dessa necessidade eu nunca padeci, salvo nos momentos de carência absurda em que alguém que dependesse muito de mim parecia algo deveras atraente...
Querer um filho é diferente de estar disposto a criar um filho, com todas as suas nuances. "Ter" um filho não pode significar "perpetuar a espécie", simplesmente, "tornar-se imortal", colocar no mundo alguém que contará a sua história, seguindo aquela máxima BIZARRA de que a missão do homem na terra é plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro...
Assim, o momento perfeito para gerar uma criança é aquele em que duas pessoas estão COMPLETAMENTE dispostas a aceitar a sua incompletude e desenvolver-se ao lado da criaturinha que cresce, descobre, aprende e compreende. E mais, a compreende-la, a guia-la, a ser firme se necessário. O filho é um projeto que se concretiza aos poucos, e que nunca estará terminado. É, indubitavelmente, um projeto PARA O MUNDO, com plena autonomia e sempre incompleto. O filho NUNCA é seu. Só leva sua assinatura e seu orgulho...
Por isso adoro o fato de Heitor chegar em uma família já pronta, unida em si, mas onde cada um tem sua função social no mundo e não depende definitivamente do outro... Cada membro da família sendo independente e autônomo, ELE deverá encontrar o seu papel nela. Quero me esforçar para não mudar nadinha em razão da chegada dele: nem os móveis da sala (ok, levantarei uma tentadora corda de flores que até eu sinto vontade de puxar...), nem as minhas metas e projetos.
Adoro também a "incompletude" de nossas próprias vidas nesse momento, os sonhos sem alcançar, os projetos de vida a realizar... Heitor não é um fim em si, é mais uma força, mais um braço da família para lutar e conseguir. Foi bom para mim ver minha mãe estudar, formar, começar a trabalhar... Vai ser bom para ele, também, ver a mãe e o pai alcançando seus sonhos, atingindo suas metas, mudando, construindo...

Digam o que quiserem (só não joguem tomates): não considero Heitor um "presente" ao qual a nossa vida deve se adaptar... Acho que devemos ensina-lo a se adaptar ao mundo que construímos, o qual já estava estruturado quando ele chegou... A lutar para muda-lo, caso assim deseje. E ele deve, sozinho, aprender a somar-se ao casal, aos avós, tios, primos e parentes que passaram a ser dele (ou "com ele"), mas que são outras coisas também, são profissionais, são esposos, têm outras "máscaras" e outros papéis a exercer...
Realmente acredito que crianças assim têm mais consciência de seus limites e de seu lugar no mundo. Limitar ou modificar a nossa rotina por conta dele não pode significar deixar que ele perceba ser a causa disso. Bom, pelo menos não depois dos 2 anos de idade...
Filhos que nascem e crescem convivendo com relações felizes, sem "necessidades", absorvendo, sem traumas e aos poucos, as "manias do papai" e "maus hábitos da mamãe", até mesmo os seus medos e "faltas de educação", em minha opinião, são crianças destinadas a serem mais leves, mais seguras... Que sabem que o mundo lá fora não é perfeito, não é todo delas, não é como um vídeo do Barney. Sabem somar, sem subtrair. Sabem achar seu espaço.
Ensinar valores, aceitar os erros, ser rígido ou maleável, tudo isso REQUER, aliás, EXIGE muita segurança em SUA própria vida. Exige muita disposição para amar, para tolerar, para ouvir, para conviver e compartilhar: mas também muita segurança para não ceder, para guiar, para ignorar a dor provocada e ser firme no propósito de fazer um ser humano melhor, tão necessário a um mundo cheio de canalhas... Saber ter orgulho e premiar os acertos, mas saber apontar os erros e conduzir aos bons caminhos...
Heitor nunca me impedirá de mandar em meu nariz. De realizar meus sonhos e atingir minhas metas. Nunca terá, contudo, de carregar fardo outro que não seja o de ser o que é, ser imperfeito sobre a Terra, em um país tropical luso-americano, ser meio gaúcho e meio baiano, gerado em terras macuxis e desde as primeiras semanas, viajando o país em asas metálicas......
Comentários
2 Comentários

2 comentários:

  1. Vou ler esse post todos os dias antes de dormir, até o dia de engravidar!

    Qd penso em filho, minhas maiores preocupações são a respeito de como criar uma pessoa que se sinta segura, que seja consciente de suas escolhas e que assuma as consequências delas, que seja independente e, o mais importante, sinta-se completa, sem vazios!

    Vc é a primeira grávida que falou (escreveu) o que eu queria ouvir (ler) a respeito do assunto. Fico muito feliz com isso.

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  2. Isso é porque eu sou uma pessoa segura, consciente de minhas escolhas e que assumo as consequências delas, independente e sem vazios!!! uhauahauhaua
    A regra é: desencana e abstrai. Educar uma criança não pode combinar com perfeição. INDUBITAVELMENTE se tratará de uma criatura de quem você tem orgulho, única em suas imperfeições... Eu agora tou relax. Mas já pensei igualzinho a você...
    Bjinhos

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